sexta-feira, 31 de outubro de 2008

LEI N.º 61/2008, DE 31 DE OUTUBRO


Foi publicada hoje no Diário da República a Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro (altera o regime jurídico do divórcio).


Este regime entra em vigor 30 dias após a respectiva publicação e não se aplica aos processos pendentes (na prática, será apenas aplicável aos processos de divórcio ou de regulação das responsabilidades parentais que forem instaurados a partir de 2 de Dezembro de 2008).


O link para o acesso ao diploma é o seguinte: -


quarta-feira, 29 de outubro de 2008

DIA MUNDIAL DOS DIREITOS HUMANOS - 10 DE DEZEMBRO DE 2008


O Tribunal de Família e Menores do Barreiro e a Delegação do Barreiro da Ordem dos Advogados levam a efeito uma iniciativa com o objectivo de assinalar o 60.º Aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem e o Dia Mundial dos Direitos do Homem.

No próximo dia 10 de Dezembro de 2008, pelas 17 horas, no Auditório da Biblioteca Municipal do Barreiro, terá lugar uma conferência cujos oradores serão o Professor Doutor José de Melo Alexandrino, Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, o Dr. Carlos Lopes do Rego, Procurador-Geral Adjunto no Tribunal Constitucional, e o Dr. Carlos Pinto de Abreu, advogado e Presidente do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados (anterior Presidente da Comissão de Direitos Humanos da OA).

Esta conferência terá como tema principal de discussão e debate a problemática dos direitos fundamentais no âmbito da jurisdição da família e menores e, em particular, uma análise das situações que foram já objecto de decisão pelo Tribunal Constitucional ou pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.

Os principais destinatários desta conferência são os magistrados judiciais e do Ministério Público, advogados, solicitadores e outros profissionais ligados à jurisdição de família e menores, tendo em conta a problemática relacionada com o exercício dos direitos fundamentais contidos na Constituição da República Portuguesa e noutros instrumentos de direito internacional ou interno.

Com vista a fomentar o debate, convidamos todos os participantes a fornecerem as questões que entendam pertinentes ou que gostassem de ver discutidas pelos oradores, o que poderão fazer até ao dia 31 de Novembro de 2008, através do endereço electrónico associado a este blog do Tribunal de Família e Menores do Barreiro (
tfm.barreiro@gmail.com).

Ao longo dos próximos dias, iremos divulgar neste blog algumas questões ou decisões dos tribunais portugueses ou do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem que esperamos que possam suscitar ideias para o debate.

As inscrições para assistir a esta conferência (cuja participação é gratuita) deverão ser realizadas junto dos serviços da Delegação do Barreiro da Ordem dos Advogados.

A RONDA NOCTURNA (REMBRANDT)


“Deixo em testamento as minhas roupas de linho ou lã e as minhas coisas de pintor”
Rembrandt Harmenszoon van Rijn




Maria de Médici foi a segunda esposa do rei Henrique IV de França, o primeiro monarca da dinastia Bourbon e, após o assassinato deste em 1610, viria a ser regente do reino de França durante a menoridade do seu filho, o futuro rei Luís XIII.
Era de ascendência católica e, por isso, tentou fazer alianças com Espanha, planeando o casamento do filho Luís XIII com Ana da Áustria e da filha Elisabeth com o futuro Filipe IV.

Parte da regência de Maria de Médici foi ainda marcada pela presença do Cardeal Richelieu nas intrigas da corte e por lutas religiosas entre católicos e protestantes.
Com o início do reinado do filho, viveu uma vida de intrigas e conspiração que fizeram com que fosse exilada e, entre 1631 a 1638, viveu entre os Países Baixos, Inglaterra (aqui com o apoio do genro Carlos I), vindo a falecer na cidade de Colónia em 3 de Julho de 1642.
Apesar do exílio, esta rainha, cujo luxo e esplendor é particularmente conhecido a partir dos trabalhos de Rubens, era possuidora de enorme fortuna e conta-se que tenha sido auxiliada na fuga pela nora Ana de Áustria, mulher de Luís XIII, que também sofria com as conspirações de Richelieu.

O quadro de Rembrandt representa a companhia do Capitão Cocq que serviu de guarda de honra na visita da rainha Maria de Médici a Amsterdão e foi uma encomenda da Corporação de Arcabuzeiros desta cidade para decorar a sede da milícia, sendo por isso que o pintor utilizou dimensões monumentais para a tela (359 x 438 cm).

Apesar de ser conhecido como a Ronda Nocturna, a verdade é que um esboço preparatório permite concluir que o título original tenha sido “A companhia militar do Capitão Francis Banning Cocq e o tenente Willem van Ruytenburg”.

Contudo, o nome porque ainda hoje é conhecido resulta do estado de deterioração e obscurecido pela oxidação do verniz em que se encontrava a pintura no século XIX, bem como alguma sujidade acumulada, que fizeram que parecesse uma cena nocturna.
Só depois do restauro se concluiu que o título não se ajustava à realidade mas foi aquele pelo qual se tornou conhecida.

No quadro aparece a milícia do Capitão Cocq no momento em que este dá a ordem de marcha ao tenente Willem van Ruytenburg e, detrás de ambos, surgem os dezoito militares da companhia que pagaram uma média de cem florins ao pintor para aparecer no quadro, sabendo-se que, ao todo, Rembrandt recebeu cerca de 1600 florins por todo o trabalho.

As personagens aparecem representados pelo pintor holandês como este as conseguia contemplar em diversas ocasiões no momento em que a companhia se preparava para formar e percorrer a cidade na missão de vigilantes da ordem, aparecendo ainda outras personagens não relacionadas com esta unidade militar.

A verdade é que a visita da rainha francesa a Amsterdão foi celebrada com grande pompa e circunstância e as autoridades pretenderam representar o momento através de diversas formas.

Alguns autores afirmam que a menina que surge na tela é o retrato da esposa do pintor, que havia falecido no mesmo ano em que a obra foi concluída e cuja morte causou enorme depressão a Rembrandt.
Surge como que um espectro, algo deslocada, pois não se encontra na penumbra e as sombras não a tocam.
O traje que enverga, amarelo limão, envergando na cintura um galo branco com pinceladas azuis representa o emblema da companhia que é representado desta maneira original.

O Capitão Francis Bannig Cocq é a figura central que articula os eixos do quadro, indicando com a mão a ordem ao seu tenente e a afasta do espectador, incluindo-o na cena, outorgando-lhe a posição predominante pelo cargo.
Contudo, o Capitão Cocq não terá ficado agradado com o quadro na medida em que pretendia um retrato pessoal e não uma obra de conjunto.

O tenente da companhia é o que recebe a ordem de preparar esta para a formação, sabendo-se que era um homem de baixa estatura pelo que, para não ficar muito diminuído junto do gigantesco capitão, foi representado com o uniforme em tom amarelo que é realçado pelo raio de luz.

O quadro demonstra influências de outros autores, como Caravaggio, por força dos fortes contrastes entre a penumbra e a luz.

O local original para a colocação deste quadro foi o grande salão da Companhia de Arcabuzeiros de Amsterdão mas, no século XIX, este edifício foi destruído e o quadro foi mudado para a sede do município.

Em 1885, finalizaram as obras do edifício onde se encontra, a Galeria Nacional de Arte dos Países Baixos Rijksmuseum, não obstante tenha sido mudada para local de segurança durante a ocupação alemã da 2.ª Guerra Mundial.

Esta obra foi alvo de diversos actos de vandalismo.
No século XVII, foi parcialmente cortada e, muito tempo depois, em 13 de Fevereiro de 1975, um doente mental atacou a obra com uma faca provocando-lhe diversos cortes em ziguezague, obrigando ao restauro.
Porém, em 1985, um visitante do museu pulverizou a pintura com um aerosol de ácido que levava escondido, o que foi evitado pelos guardas que impediram que atingisse a tela, obrigando apenas a alguns restauros no verniz.

Esta obra inspirou outros artistas, particularmente na escultura, no cinema e na música, constituindo um dos trabalhos mais importantes do barroco holandês, sendo a obra de referência do Rijskmuseum (
http://www.rijksmuseum.nl/), em Amsterdão.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

GUERNICA (PABLO PICASSO)


“Esta pintura não foi feita para decorar casas.
É um instrumento de guerra ofensivo e defensivo contra o inimigo”
Pablo Picasso



Com a implantação da Segunda República em Espanha, assistiu-se ao triunfo do “puro parlamentarismo”, com uma câmara única, um governo apoiado por uma confortável maioria republicano-socialista e assente no sufrágio universal.
A Constituição espanhola baseava-se no modelo de Weimar, as regiões podiam solicitar um estatuto de autonomia e o voto viria a ser alargado às mulheres e aos soldados.
Contudo, a República confrontava-se com problemas complexos e com uma crescente reorganização dos sectores conservadores os quais, mediante uma coligação de forças políticas, venceram as eleições em 1933, promovendo a ascensão de um conjunto de militares, entre os quais se encontrava o General Francisco Franco.
Em Fevereiro de 1936, a vitória eleitoral da Frente Popular alimentou as expectativas de reformas sociais profundas e encorajou a iniciativa expontânea das massas. Inversamente, a oligarquia agrária, a burguesia espanhola, o clero e a hierarquia militar convenceram-se da necessidade de abolir a democracia.
Na madrugada de 18 de Julho de 1936, ocorreu um levantamento militar em Marrocos, liderado pelo General Francisco Franco, o qual contava com o apoio da Alemanha de Hitler e da Itália de Mussolini.
Com esse apoio, o que chegara a parecer um “putsch” militar sem possibilidades de sucesso, viria a tornar-se uma guerra civil de quase três anos e cerca de um milhão de mortos e, muito mais do que espanhola, essa guerra civil iria ser uma saga europeia e internacional.

O acontecimento durante a Guerra Civil de Espanha que inspirou este quadro de Pablo Picasso foi o bombardeamento executado por aviões da Legião Condor (da Alemanha nazi) sobre a cidade basca de Guernica, em 26 de Abril de 1937, por ordem do General Franco.
Entre os sete mil habitantes, contaram-se cerca de 1654 mortos e 889 feridos, sendo a destruição de Guernica a primeira demonstração da “técnica de bombardeamentos de saturação” que, mais tarde, viria a ser utilizada na 2.ª Guerra Mundial.

Em estilo cubista, a pintura foi executada sem o uso de cores, em preto e branco o que, por um lado, demonstra o sentimento de repúdio do artista em relação ao acontecimento mas também permite concluir que Picasso, morando em Paris, teve conhecimento dos factos através dos jornais e tenha resultado daqui a inspiração para a apresentação monocromática daquele facto.
A composição retrata as figuras ao estilo dos frisos dos templos gregos, através de um enquadramento triangular dos mesmos. O posicionamento diagonal da cabeça feminina, olhando para a esquerda, remete o observador a dirigir também o seu olhar da direita para esquerda, até à lanterna ainda acesa sobre um braço decepado e, finalmente, à representação da explosão de uma bomba.

Em primeiro plano, surge uma figura fragmentada com a cabeça cortada, à esquerda, e um braço também cortado, ao centro, agarrando uma espada quebrada, emblema da resistência. Junto a esta, encontra-se uma flor, como uma mensagem de esperança numa vida nova, apesar das tentativas do homem para a destruir constantemente.
A comovente delicadeza da flor parece aumentar o horror geral da cena caótica.

A representação de um touro no quadro é ambígua já que este não parece selvagem, estando a abanar o rabo, parecendo que a sua presença se deve também ao fascínio que Picasso sempre sentiu pela tourada, sendo frequentes estas imagens nos seus trabalhos.

Surge ainda outra imagem, apresentando uma criança morta, pendendo inerte nos braços da mãe. O grito desta está representado pela língua que sugere um punhal ou um estilhaço de vidro, surgindo formas semelhantes um pouco por todo o quadro.
A angústia no rosto desta mulher que segura o seu filho é especialmente penetrante, aumentada pelo contraste entre o estilo do rosto e a representação mais convencional da criança.

Conta-se que Picasso teria afirmado que o cavalo representado no centro do quadro, personificaria o povo enquanto que o candeeiro eléctrico por cima da cabeça deste, aceso e em forma de sol, sugere o “olho de Deus” que tudo vê.
No lado direito do quadro, duas mulheres olham horrorizadas para o cavalo ferido, com um misto de medo e pena, sugerindo certas semelhanças, no conceito e semelhança, com as imagens de Cristo na cruz e a presença das três Marias nesta cena.
Talvez Picasso procurasse uma imagem moderna e secular para exprimir o sofrimento humano mas uma que não tivesse qualquer simbolismo cristão explícito.

A figura à direita do quadro parece estar a ser consumida pelas chamas de um edifício a arder, sendo frequentemente comparada à figura central dos fuzilamentos do “3 de Maio de 1808” de Francisco Goya, sendo evidente a semelhança entre os elementos que conduziram a ambos os quadros pois ambos retratam actos de selvagem brutalidade contra pessoas inocentes.

Picasso realizou este quadro para a Exposição Internacional de Paris, realizada em 1937 e conta-se que, no ano de 1940, com Paris ocupada pelo exército alemão, um oficial deste país, perante uma fotografia reproduzindo o painel, perguntou a Picasso se havia sido ele quem tinha feito aquilo.
Picasso teria então respondido: - “Não, foram vocês!”.

Durante a 2.ª Guerra Mundial, o quadro foi transferido para Nova Iorque com instruções expressas de Pablo Picasso de que apenas poderia ir para Espanha quando este país alcançasse a democracia.
Esteve exposto no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MOMA) até 9 de Setembro de 1981, data em que regressou finalmente a Madrid, cumprindo a vontade de Picasso, encontrando-se agora no Centro de Arte Reina Sofia (http://www.museoreinasofia.es), onde ocupa um lugar de destaque e onde é possível também conhecer a história sobre a execução do mesmo.
Com o regresso do quadro “Guernica” a Madrid, tinha chegado ao final a peregrinação desta obra a que os espanhóis chamaram “o último exilado”.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

COMUNICADO DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA SOBRE O NOVO REGIME JURÍDICO DO DIVÓRCIO

O Senhor Presidente da República promulgou o decreto da Assembleia da República que altera o regime jurídico do divórcio com a mensagem que transcrevemos em seguida e que também está disponível no site da Presidência da República.

«O Presidente da República promulgou como lei o Decreto nº 245/X, da Assembleia da República, o qual aprovou, por uma expressiva maioria, o novo regime jurídico do divórcio.

Não obstante, o Presidente da República considera essencial prestar os seguintes esclarecimentos aos Portugueses:

1 – Ao contrário do que alguns sectores pretenderam fazer crer junto da opinião pública, os fundamentos do veto do Decreto nº 232/X, bem como os motivos subjacentes à emissão do presente comunicado, não têm por base qualquer concepção ideológica sobre o casamento.

2 – Como resulta claramente da mensagem então enviada à Assembleia da República, entende-se, isso sim, que o novo regime jurídico do divórcio irá conduzir na prática a situações de profunda injustiça, sobretudo para aqueles que se encontram em posição de maior vulnerabilidade, ou seja, como é mais frequente, as mulheres de mais fracos recursos e os filhos menores.

3 – Esta convicção do Presidente da República decorre da análise a que procedeu da realidade da vida familiar e conjugal no nosso País, e é partilhada por diversos operadores judiciários, com realce para a Associação Sindical dos Juízes Portugueses, por juristas altamente qualificados no âmbito do Direito da Família e por entidades como a Associação Portuguesa das Mulheres Juristas.

4 – A este propósito, deve destacar-se, até por não lhe ter sido dado o relevo que merecia, o parecer emitido em 15 de Setembro último pela Associação Portuguesa das Mulheres Juristas, o qual manifesta «apreensão» pelo novo regime jurídico do divórcio, afirmando, entre o mais, que o mesmo «assenta numa realidade social ficcionada» de «uma sociedade com igualdade de facto entre homens e mulheres» e não acautela «os direitos das mulheres vítimas de violência doméstica e das que realizaram, durante a constância do casamento, o trabalho doméstico e o cuidado das crianças». Tendo sido oportunamente enviado aos diversos grupos parlamentares, este documento encontra-se disponível em www.apmj.pt.

5 – Na verdade, num tempo em que se torna necessário promover a efectiva igualdade entre homens e mulheres e em que é premente intensificar o combate à violência doméstica, o novo regime jurídico do divórcio não só poderá afectar seriamente a consecução desses objectivos como poderá ter efeitos extremamente nefastos para a situação dos menores.

6 – A profunda injustiça da lei emerge igualmente no caso de o casamento ter sido celebrado no regime da comunhão geral de bens, podendo o cônjuge que não provocou o divórcio ser, na partilha, duramente prejudicado em termos patrimoniais.

7 – Para mais, o diploma em causa, incluindo a alteração agora introduzida no artigo 1676º do Código Civil, padece de graves deficiências técnico-jurídicas e recorre a conceitos indeterminados que suscitam fundadas dúvidas interpretativas, dificultando a sua aplicação pelos tribunais e, pior ainda, aprofundando situações de tensão e conflito na sociedade portuguesa.

8 – Por fim, ao invés de diminuir a litigiosidade, tudo indicia o novo diploma a fará aumentar, transferindo-a para uma fase ulterior, subsequente à dissolução do casamento, com consequências especialmente gravosas para as diversas partes envolvidas, designadamente para as que cumpriram os deveres conjugais e para as que se encontram numa posição mais fragilizada, incluindo os filhos menores.

9 – Em face do exposto – e à semelhança do que sucedeu noutras situações, com realce para os efeitos do regime da responsabilidade extracontratual do Estado –, o Presidente da República considera ter o imperativo de assinalar aos agentes políticos e aos cidadãos os potenciais efeitos negativos do presente diploma, em particular as profundas injustiças para as mulheres a que pode dar lugar.

10 – A aplicação prática do diploma deve, por isso, ser acompanhada de perto pelo legislador, com o maior sentido de responsabilidade e a devida atenção à realidade do País.»

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

DEBATE SOBRE O NOVO REGIME JURÍDICO DO DIVÓRCIO

No passado dia 17 de Outubro, com início pelas 17 horas, decorreu na sala de audiências do Tribunal de Família e Menores do Barreiro uma conferência sobre o novo regime do divórcio e das responsabilidades parentais.
Por motivos relacionados com o seu estado de gravidez, a Dra. Ana Catarina Mendes, deputada do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, não pôde estar presente, o que não permitiu a exposição sobre as razões de política legislativa do regime aprovado.

A primeira intervenção nesta conferência ficou a cargo do Dr. Tomé d’Almeida Ramião, Juiz de Direito no Tribunal de Família e Menores do Barreiro e autor de diversas obras publicadas relativas a esta jurisdição, o qual enunciou algumas das questões suscitadas a propósito das alterações ao regime jurídico do divórcio, em particular na parte relativa ao divórcio sem consentimento.

Na sua intervenção, o Dr. Tomé Ramião referiu que o novo regime jurídico aprovado suscita algumas dificuldades no trabalho dos tribunais, referindo em particular a inexistência de um regime processual adequado para as situações em que o tribunal deva decretar o divórcio mas em que fiquem por resolver as restantes questões que possam suscitar conflitos entre as partes.

Numa segunda intervenção, o Dr. Alexandre de Sousa Machado, advogado e docente na Faculdade de Direito da Universidade Católica de Lisboa, afirmou que o regime jurídico aprovado não era uma exigência social, face à reduzida expressão de divórcios litigiosos nos tribunais, explicitando, em particular, as dificuldades que irão colocar-se aos tribunais a propósito dos denominados créditos compensatórios entre os cônjuges e a substancial alteração na filosofia emergente da solidariedade conjugal que fica posta em causa.

Finalmente, numa terceira intervenção, o Dr. António José Fialho, Juiz de Direito no Tribunal de Família e Menores do Barreiro, afirmou não considerar correcta a opção de estabelecer como regra o exercício conjunto das responsabilidades parentais em situações de dissociação familiar, em particular quando nem sequer tenha havido vivência em comum entre os progenitores, o que pode suscitar conflitos quanto ao projecto de vida das crianças e, desta forma, prejudicar os seus interesses.

Referiu ainda que o novo regime jurídico encontra-se preenchido com alguns conceitos indeterminados novos (como a orientação educativa do menor) ou outros já existentes mas cujo âmbito de aplicação será aumentado (questões de particular importância e actos da vida corrente) os quais, numa situação de conflito entre os progenitores, tenderão a bloquear as decisões sobre a vida do menor.

Com uma sala cheia de advogados, outros juristas e alunos universitários, o debate foi animado, em particular sobre as tarefas que se exigem num futuro próximo aos advogados, com vista a prevenir ou a eliminar determinados conflitos.

Em face da indisponibilidade da Dra. Ana Catarina Mendes (a quem desejamos felicidades no momento que se aproxima), o Tribunal de Família e Menores do Barreiro e a Delegação da Ordem dos Advogados da Comarca do Barreiro pretendem levar a efeito, em data a anunciar, outra iniciativa subordinada a este tema, esperando, desta feita, contar com a presença daquela deputada.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

A MORTE DE MARAT (JACQUES LOUIS DAVID)


“Dar corpo e forma perfeita ao pensamento,
eis o que é ser artista”
Jacques Louis David



Jean-Paul Marat nasceu em Boudry (Suíça) em 24 de Maio de 1743 e faleceu em Paris em 13 de Julho de 1793.
É conhecido como uma das personagens mais importantes da Revolução Francesa.

Filho do italiano Giovanni Marra, estudou medicina em Paris e em Bordéus, terminando o curso em Inglaterra, doutorando-se em 1775.
De regresso a França, é nomeado médico da guarda pessoal do Conde d’Artois, irmão mais novo do rei Luís XVI.

Porém, em 1783, abandona a profissão de médico para se dedicar exclusivamente à ciência, publicando artigos sobre experiências com fogo, luz e electricidade.
Interessa-se por outros temas e, em 1780, havia publicado o Plan de Législation Criminelle (Plano de Legislação Criminal), obra considerada subversiva pelo regime monárquico.
É assim que, um ano depois, o seu ingresso na Academia de Ciências é recusado, circunstâncias que provocam o seu desencanto com a aristocracia no poder.

Em 1789, funda o jornal “O Amigo do Povo”, revelando-se defensor das causas populares. Condenado várias vezes, é visto como o porta-voz do Partido Jacobino, a ala mais radical da Revolução Francesa, refugiando-se na Inglaterra entre 1790 a 1791, após o que regressa a Paris.

Quando os “sans-cullote”, orientados pelos jacobinos, proclamam a República e instituem a Comuna de Paris como órgão executivo do governo, Marat é eleito como um dos dirigentes.
Contudo, no ano seguinte, Charlotte Corday, apoiante do partido girondino, fazendo-se passar por informadora e aproveitando a circunstância de Marat necessitar de passar várias horas na banheira em consequência de uma doença de pele, entra em casa deste e assassina-o, utilizando para o efeito um punhal que trazia escondido.

É esta a imagem que é retratada no quadro de Jacques David, pintado em 1793, representando com grande realismo a imagem do corpo de Marat, já cadáver e deitado na banheira, ainda empunhando a pena com que escrevia no momento em que foi assassinado.

Marat surge representado como um mártir da Revolução Francesa, traiçoeiramente assassinado num momento em que se encontrava indefeso, sendo visível ainda a arma do crime e os golpes que provocaram a sua morte.

Gravada no banco de trabalho de Marat, surge a dedicatória e a assinatura do autor, numa espécie de epitáfio fúnebre presente nesta obra que pode ser apreciada no Museu Real de Belas Artes, em Bruxelas (
http://www.fine-arts-museum.be).

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

A RENDIÇÃO DE BREDA (DIEGO VELASQUÉZ)


“Velásquez, quando tudo for dito
e feito, é ele o melhor”
Pablo Picasso




No final do século XVI e início do século XVII, os Países Baixos lutavam pela independência da Espanha numa guerra denominada “Guerra dos Oitenta Anos” ou “Guerra de Flandres”, sob a direcção de Guilherme de Orange.
Em 1590, a cidade de Breda havia sido conquistada pelos holandeses e uma trégua de doze anos manteve a paz entre 1609 a 1621.

Após a subida ao trono de Filipe IV de Espanha em 1621, cessaram as tréguas e recomeçou a guerra, sendo intenção do rei espanhol recuperar aquela cidade, a partir da qual poderia manobrar para outras conquistas.
Filipe IV nomeou como chefe supremo da expedição a Breda o seu melhor estratega, o general Ambrósio de Spínola, ao comando de trinta mil homens, entre os quais se incluíam os militares Marquês de Leganés e D. Carlos Coloma.
Por seu turno, a cidade de Breda estava defendida por Justino de Nassau, um nobre da Casa de Orange.

O cerco à cidade foi uma lição de estratégia militar, de tal forma que alguns generais de outras nações compareceram naquela zona para conhecer e observar as tácticas do General Ambrósio de Spínola, em particular as acções secundárias que consistiram em alagar os terrenos circundantes da cidade para impedir o reforço de víveres e munições.
As crónicas afirmam que a defesa de Breda foi um acto de heroísmo mas, finalmente, a guarnição foi obrigada a render-se em 5 de Junho de 1625.
Os espanhóis entenderam essa rendição como honrosa, admirando no inimigo a valentia que demonstraram durante todo o cerco.
Por essa razão, o General Ambrósio de Spínola permitiu que a guarnição abandonasse a cidade formada em ordem militar e com as respectivas bandeiras, dando ordem para que os vencidos foram rigorosamente respeitados e tratados com dignidade.
Contam também as crónicas o momento em que o general espanhol aguardava fora das fortificações o General Justino de Nassau, sendo a entrevista um acto de cortesia, na qual o inimigo foi tratado com cavalheirismo e sem humilhação.

Esse é o momento histórico que Velásquez escolheu pintar o seu quadro “A Rendição de Breda”, exposto agora no Museu do Prado, em Madrid (
http://www.museodelprado.es).
Os dois principais protagonistas estão no centro do quadro e parecem conversar mais como amigos do que inimigos.
Justino de Nassau surge com as chaves da cidade de Breda na mão e mostra intenção de ajoelhar-se perante Ambrósio de Spínola, sendo impedido por este que coloca a mão sobre o ombro do militar holandês para evitar que se humilhe.
Traduz uma ruptura com a tradicional representação do herói militar, o qual costumava ser representado erguido sobre o vencido, expressando uma visão cavalheiresca do acto de rendição.

Este quadro tem ainda a curiosidade de não estar assinado nem datado pois Velásquez reservou um pequeno espaço para o fazer (a zona em branco no canto inferior direito), o que nunca chegou a concretizar.
A Rendição de Breda constitui uma das obras mais imponentes do Museu do Prado, em Madrid, não apenas pelo significado histórico mas também pela excelente representação de um acto de honra entre dois homens que se encontraram na posição de inimigos.

A título de curiosidade, no filme de língua castelhana “O Capitão Alatriste”, onde desempenha o papel principal o conhecido actor Viggo Mortensen, é feita uma referência ao acontecimento relatado neste quadro e à própria execução do mesmo por Velásquez.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

O 3 DE MAIO DE 1808 (FRANCISCO GOYA)



“O sono da razão produz monstros terríveis”
Francisco José de Goya y Lucientes



Manuel Godoy, o famoso ministro do rei Carlos IV de Espanha, fez um acordo com Napoleão Bonaparte no sentido de permitir a passagem de tropas francesas pelo território espanhol para conquistar Portugal.
Contudo, os franceses ocuparam também a Espanha, o que provocou a ira do povo espanhol contra o rei e o seu ministro e conselheiro, obrigando aquele a abdicar a favor do filho Fernando VII.

A revolta do povo de Madrid ocorreu em 2 de Maio de 1808, quando tenta evitar a saída do infante D. Francisco de Paula de Bourbon para França. Foi uma revolta duramente reprimida, como reconhece o comandante das forças francesas, o marechal Joachim Murat, o qual escreveu no seu diário: “O povo de Madrid deixou-se arrastar à revolta e ao assassinato … sangue francês foi derramado. Sangue que demanda vingança”.
Assim, todos os madrilenos que foram encontrados com armas foram executados, num total de cerca de quatrocentos.
Cerca de quarenta e quatro dos revolucionários foram juntos e fuzilados na noite de 2 para 3 de Maio, na colina do Príncipe Pio, em Madrid, sendo esse o episódio relatado por Francisco José de Goya y Lucientes no seu quadro.

Depois das sublevações de Maio, Napoleão Bonaparte, cada vez mais impaciente com os acontecimentos de Espanha, colocou no trono o seu irmão, o qual reinou como José I entre 1808 a 1813.

Pouco tempo após a derrota de Napoleão, o Conselho da Regência convidou Francisco de Goya para pintar “as acções ou episódios mais nobres da gloriosa insurreição dos espanhóis contra o tirano da Europa” e com vista a celebrar o regresso do rei Fernando VII a Espanha.

Goya escolheu o tema da revolta de Madrid, ocorrida em 2 de Maio de 1808 e sufocada logo no dia seguinte, onde foram fuzilados todos os insurrectos e todos os suspeitos da participação na revolta.
É justamente o culminar desse drama que o pintor escolheu para representar nesta obra a qual dispõe de duas situações distintas e que pode ser apreciado no Museu do Prado, em Madrid (
http://www.museodelprado.es/).

Entre as vítimas do fuzilamento, formam-se três grupos: - os que estão à espera de ser fuzilados e observam com horror o seu futuro, os que estão já mortos e estendidos no chão e os que estão prestes a ser fuzilados, da direita para a esquerda, introduzindo um elemento de decurso do tempo na composição.

Neste último grupo, destaca-se a figura central de um homem, fortemente iluminada e envergando uma camisa branca, de braços abertos, como que esperando a saraivada de balas e onde é visível na mão esquerda a marca de um estigma, sendo intencional a associação ao martírio de Cristo na cruz.
Merece também destaque a figura de um frade, ajoelhado na primeira fileira das vítimas, procurando representar o papel que a Igreja Católica teve na revolta, promovendo a resistência a partir dos altares, numa oposição a Napoleão face à decisão deste de ordenar o encerramento de dois terços dos conventos e de suprimir a Inquisição.

O artista não representa o rosto dos soldados no pelotão de fuzilamento, apresentando-os uniformizados no seu alinhamento militar e desprovidos de identidade individual, como que traduzindo apenas um braço desumano que age segundo uma vontade superior.
Ao contrário destes, os homens que esperam a execução aparecem altamente individualizados. Prontos para a morte, assumem diferentes atitudes e revelam diferentes reacções.

O quadro do “3 de Maio de 1808”, do pintor espanhol Francisco de Goya, é uma das obras mais expressivas contra os horrores da guerra e tem sido fonte de diversos outros trabalhos.