
Artigo 1776.º-A
Acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais
1 - Quando for apresentado acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais relativo a filhos menores, o processo é enviado ao Ministério Público junto do tribunal judicial de 1.ª instância competente em razão da matéria no âmbito da circunscrição a que pertença a conservatória, para que este se pronuncie sobre o acordo no prazo de 30 dias.
2 - Caso o Ministério Público considere que o acordo não acautela devidamente os interesses dos menores, podem os requerentes alterar o acordo em conformidade ou apresentar novo acordo, sendo neste último caso dada nova vista ao Ministério Público.
3 - Se o Ministério Público considerar que o acordo acautela devidamente os interesses dos menores ou tendo os cônjuges alterado o acordo nos termos indicados pelo Ministério Público, segue-se o disposto na parte final do n.º 1 do artigo anterior.
4 - Nas situações em que os requerentes não se conformem com as alterações indicadas pelo Ministério Público e mantenham o propósito de se divorciar, aplica-se o disposto no artigo 1778.º.
Artigo 1778.º
Remessa para o tribunal
Se os acordos apresentados não acautelarem suficientemente os interesses de um dos cônjuges, e ainda no caso previsto no n.º 4 do artigo 1776.º-A, a homologação deve ser recusada e o processo de divórcio integralmente remetido ao tribunal de comarca a que pertença a conservatória, seguindo-se os termos previstos no artigo 1778.º-A, com as necessárias adaptações.
Introduzidas pelas alterações ao regime do divórcio e das responsabilidades parentais (Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro), esta nova redacção a estes artigos do Código Civil consagram o procedimento relativo ao divórcio por mútuo consentimento que corre na conservatória do registo civil e a tramitação subsequente à apresentação dos acordos sobre as responsabilidades parentais, no primeiro caso, ou à apresentação sobre a relação especificada dos bens comuns, sobre as responsabilidades parentais, sobre a prestação de alimentos ao cônjuge que deles careça e sobre o destino da casa de morada de família (artigo 1775.º do Código Civil, na redacção conferida pela citada Lei n.º 61/2008).
Vejamos cada uma das situações
Assim, no primeiro caso, apresentado acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais relativo a filhos menores, o processo é enviado ao Ministério Público junto do tribunal judicial de 1.ª instância competente em razão da matéria no âmbito da circunscrição a que pertença a conservatória para que este se pronuncie.
Nos termos do artigo 82.º, n.º 1, alínea d), da Lei da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais (Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro), o tribunal judicial de 1.ª instância competente em razão da matéria, caso esteja instalado, é o tribunal de competência especializada mista de família e menores.
Caso o Ministério Público considere que o acordo não acautela devidamente os interesses dos menores, podem os requerentes alterar o acordo em conformidade ou apresentar novo acordo, sendo neste último caso enviado novamente ao Ministério Público para que se pronuncie.
Se o Ministério Público considerar que o acordo acautela devidamente os interesses dos menores ou tendo os cônjuges alterado o acordo nos termos indicados pelo Ministério Público, o conservador decreta o divórcio (artigo 1776.º, n.º 1, “in fine” e 1776.º-A, n.º 3 do Código Civil).
Contudo, se os requerentes não se conformarem com as alterações indicadas pelo Ministério Público e mantiverem o propósito de se divorciarem, o conservador recusa a homologação do divórcio e o processo de divórcio é integralmente remetido ao tribunal da comarca a que pertença a conservatória (artigos 1778.º e 1776.º-A, n.º 4, ambos do Código Civil).
É consagrada uma redacção semelhante ao n.º 7 do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 272/2001, de 13 de Outubro (rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 20-AR/2001, de 30 de Novembro, e alterado pelo Decreto-Lei n.º 324/2007, de 28 de Setembro).
Em anotação a este artigo, esclarece Tomé d’Almeida Ramião (Divórcio por Mútuo Acordo - Anotado e Comentado, 7.ª edição, pgs. 109-110) que “é de sublinhar que, neste último caso, o legislador atribui competência ao tribunal da comarca da área da conservatória e não (…) ao tribunal competente em razão da matéria no âmbito da circunscrição a que pertença a conservatória.
Fê-lo intencionalmente.
Donde, serem excluídos os tribunais de família e de menores, ainda que em funcionamento na área dessa conservatória.
Opção esta que se prende com o facto de ser atribuída competência exclusiva à conservatória do registo civil, em matéria de divórcio e separação judicial de pessoas e bens por mútuo consentimento.
Essa competência é dos tribunais de comarca e, havendo juízos de competência especializada cível, destes (artigos 77.º, n.º 1, alínea a), e 94.º, ambos da Lei da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais).”
Vejamos agora a segunda situação.
O divórcio por mútuo consentimento pode ser instaurado a todo o tempo na conservatória do regime civil, mediante requerimento assinado pelos cônjuges ou seus procuradores, acompanhado de um conjunto de acordos (em termos simples, relação dos bens comuns ou acordo sobre a partilha destes, sentença de regulação do exercício da responsabilidades parentais ou acordo de regulação deste exercício, acordo sobre a casa de morada de família e acordo sobre a prestação de alimentos ao cônjuge que deles careça).
Caso o conservador do registo civil entenda que os acordos apresentados não acautelem suficientemente os interesses de um dos cônjuges, a homologação deve ser recusada e o processo de divórcio é integralmente remetido para o tribunal de comarca a que pertença a conservatória.
Também aqui o legislador estabeleceu intencionalmente a competência do tribunal de comarca - e não do tribunal de 1.ª instância competente em razão da matéria - para prosseguir com o processo de divórcio nestes termos (artigos 1778.º e 1778.º-A, ambos do Código Civil, na redacção dada pela Lei n.º 61/2008).
Por outro lado, nas situações em que a competência em matéria cível esteja atribuída em função da possibilidade de intervenção do tribunal colectivo (ou seja, entre varas cíveis e juízos cíveis), parece-nos que esta competência deve recair sobre estes últimos tribunais na medida em que os mecanismos de tramitação processual previstos no artigo 1778.º-A do Código Civil não fazem pressupor a possibilidade de intervenção do colectivo (artigo 97.º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro).
Solução que não se compreende face às sugestões oportunamente remetidas pelos representantes dos juízes para as quais fomos convidados a colaborar.
Solução manifestamente incompreensível quando é certo que o conjunto de conceitos indeterminados e as soluções inovadoras resultantes da Lei n.º 61/2008, de 31 de Outubro, aconselham a que a sua aplicação seja preferencialmente realizada por tribunais de competência especializada.
Criticamos esta solução não obstante a mesma poder vir a traduzir-se numa diminuição do trabalho dos tribunais de família e menores, demonstrando assim que aquilo que constitui a preocupação dos juízes não se traduz nas suas próprias regalias e privilégios mas sim em procurar soluções que permitam uma melhor administração da justiça que, neste caso, pressupõe o recurso a instâncias judiciais dotadas de maior especialização em função das matérias que lhes são colocadas.
Finalmente, e sem prejuízo de opinião diversa, pretendemos apenas alertar os aplicadores principais destas disposições normativas (que serão os advogados, os conservadores do registo civil e os juízes) para esta realidade que, por certo, terá ainda passado despercebida a alguns, face à manifesta incongruência desta solução que nem mesmo os espíritos mais prevenidos poderiam conjecturar.