quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

GRUPO DE ARDINAS (FOTO DE 1917 - AUTOR DESCONHECIDO)


“Fogo nos pés, chispas nos olhos, garganta de metal bem sonoro, línguas afiadas na resposta como outras não há, corpos geralmente franzinos no aspecto e gigantes no esforço - eis os ardinas”.

Esta é a descrição que o Diário Ilustrado de 8 de Dezembro de 1956 fazia da profissão do miúdo ardina, típica figura urbana que corria pelas ruas apregoando os jornais periódicos.

Os rapazes que iniciavam esta profissão começavam muito cedo, aos sete ou oito anos. Era uma vida muito dura que se iniciava pelas cinco ou seis da manhã, com a ida ao Bairro Alto (onde se situavam a grande maioria dos jornais da capital) buscar os matutinos, que eram depois entregues nas caixas do correio, à porta de casa dos clientes regulares ou vendidos na rua, estações, transportes públicos e estabelecimentos.

Muitos destes miúdos, pequenos e franzinos, arriscavam a vida pendurados dos eléctricos - que na época eram abertos - para venderem mais uma ou duas publicações aos passageiros e muitos morriam ou ficavam aleijados ao cair do eléctrico.

Depois da volta da manhã, e após um breve descanso, se houvesse oportunidade disso, chegavam os vespertinos, que era necessário ir buscar pelas três ou quatro da tarde, para uma etapa a calcorrear a cidade.

Muitos destes miúdos dormiam na estação do Cais do Sodré ou então nos Vendedores de Jornais Futebol Clube, na Rua das Trinas, onde existia uma camarata para albergar os ardinas que não tinham tecto.

Alguns chegaram mesmo a ser detidos pela Tutoria da Infância, por andarem “descalços, mal vestidos ou rotos” onde lhes eram dados banhos de água fria e rapado o cabelo.

Esta profissão, praticada ao vento, ao frio, à chuva ou no pico do calor “deixava um rasto de luz na alma simples do povo que a admira mas queima cedo as vidas”.

O ardina era a mola real da venda dos jornais e nem sempre lhe era retribuído o esforço que seria justo. Mal ganhava para comer, explorado por alguns que monopolizavam as vendas.

Havia quem afirmasse que, mesmo que um dia se inventasse um outro processo de venda de jornais, não deveriam extinguir-se os ardinas uma vez que, sem eles, a cidade morreria, pois eles eram as mais “vivas centelhas da sua própria vida”.

A sua importância na venda dos jornais era tão evidente que o jornal podia ser dividido em três partes: - a cabeça (direcção), o tronco (a redacção) e os membros (as pernas e os braços dos ardinas).

O miúdo ardina - pequeno soldado que todos os dias lutava pela vida - era o traço de união entre o jornal e o público.

Era o cabeçalho vivo dos jornais que, todos os dias, de manhã e à tarde, eram vendidos nas cidades de Lisboa e do Porto.

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